Na ausência do filho desejado, várias mulheres têm depositado o afeto que seria destinado a uma criança em animais de estimação.
Estas mulheres dispensam a eles toda sorte de cuidados. Muitas vezes beiram o exagero e os colocam quase como “humanos”. O comércio criado em torno dos animais de estimação estimulam ainda mais esse comportamento. Comidas que imitam a humana, bufê para festas de aniversários dos bichinhos, roupas e todo tipo de apetrecho. No campo afetivo também cria-se um vínculo muito forte, que pode ficar no limite do saudável tanto para as donas, quanto para os animais.
Para Andrea o amor é tanto que ela chega a dizer que “gerou seus filhos de quatro patas”; Maria Ângela e o marido colocam seus cãezinhos para dormir com eles em dias de muito calor, para que “fiquem fresquinhos no ar condicionado.” Um latido, uma lambida na mão, um abano de rabo são recompensas prazerosas. No entanto, até que ponto essa relação de afeto está dentro da “normalidade”?
Especialistas discutem o limite do saudável e dizem que, normalmente, esse comportamento revela dificuldade de relacionamento e tem a função de suprir a carência afetiva dessas pessoas.
O exagero prejudica o bicho também. O animal necessita de espaço para exercer os instintos com os quais foi naturalmente dotado, como farejar, vigiar e brincar. “Mantê-los vestidos, perfumados, dentro de ambientes fechados e exigir deles um comportamento quase humano poderá prejudicar sua existência, seu desenvolvimento e sua saúde física e emocional”, afirma a psicóloga Margareth Alves. “O animal também sofre assumindo comportamentos neuróticos e ansiosos transmitidos pelo dono”, conta. Para ela, alguns sinais devem ser observados para evitar excesso no comportamento, como: frequentar os pet shops em exagero procurando uma novidade em roupas e acessórios, dependência afetiva em relação aos animais e isolamento social.
Geralmente, quem trata os animais como verdadeiros filhos não identifica a situação como um problema que apresente riscos a saúde e ao convívio social. “Elas não chegam ao consultório com essa queixa específica”, afirma a psicóloga Nione Torres. Para ela, a relação entre o indivíduo e o animal é também semelhante a de outros seres humanos, mas com menor intensidade. “Cada caso é um caso, mas, via de regra, um animal não conseguirá substituir, de modo adequado a relação com outras pessoas”, pondera a psicóloga Margareth Alves.
Ela ressalta que o afeto por animais faz parte da vida da maioria das pessoas. “Quem tem ou já teve um bichinho de estimação muito querido sabe o valor dessa experiência.” Brincalhões, divertidos, fiéis e protetores. Todas essas características os tornam um alvo fácil de atenção e diversão, estimulando o vínculo afetivo das pessoas com eles, segundo Margareth Alves. “Gostar de animais é natural, porém, como qualquer tipo de relacionamento, é legal enquanto for equilibrado”, afirma a psicóloga. O grande problema, como em tudo na vida, está nos exageros e em usar esta relação para compensar dificuldades. Portanto, tratar animais como pessoas pode ser inadequado quando implica em prejuízos às atividades do dono, aos seus relacionamentos familiares e sociais, ao seu lazer ou ao seu bolso.
No entanto, a psicóloga Nione Torres diz que não há dados científicos que comprovem que a transferência de carinho e afeto a um animal esteja intrinsecamente ligada à ausência de filhos, no caso das mulheres. Ela afirma que esta transferência pode ocorrer também com idosos, homens, crianças. Mas admite que as mulheres, por serem muito cobradas por não exercer seu papel de mãe, podem acabar transferindo sua capacidade de amar ao animalzinho.